segunda-feira, maio 31, 2010

A vegetariana e a nutricionista

Há muitos anos atrás houve um período da minha vida, em que trocava um belo bife da vazia por um aipo.
Durante praticamente um ano, o meu organismo só processou cereais, legumes e fruta, numa das dietas vegetarianas mais loucas do mundo, que quase me levou desta para melhor, deixando-me ligeiramente anémica.
Na altura a ignorância era muita, e o desconhecimento sobre o vegetarianismo - nulo.
A um passo de me tornar num coelho, a minha dieta estava longe de ser equilibrada, pior, eu achava que só com saladas era capaz de responder às necessidades nutricionais do corpo.

Preocupada com o rumo que a coisa estava tomar, a minha mãe não foi de modos, e resolveu que estava na altura de intervir.
Com o objectivo traçado, marcou uma consulta para a nutricionista mais conhecida da nossa praça, na esperança de conseguir um plano alimentar que melhorasse a minha dieta vegetariana, colmatando assim as falhas (graves) que tinha.
Arrastada até à consulta de nutricionismo, entro no gabinete da conceituada senhora, e fiquei perplexa, não queria acreditar, A nutricionista precisava urgentemente de um nutricionista que a tratasse, e porquê, porque A nutricionista estava gorda que nem uma lontra, e na minha cabeça aquilo não fazia sentido.
Não era correcto ter alguém a dizer-me o que comer, quando evidentemente essa pessoa precisava ela própria de um acompanhamento profissional, de alguém que a ajudasse a emagrecer uns bons quilos.
Desiludida com o primeiro impacto, lá expliquei na consulta o que é que comia exactamente num dia normal, e quais as proporções dos alimentos que faziam parte da minha dieta diária.
Como não eram muitos, a senhora ia tendo um ataque, porque segundo ela, a minha alimentação era "Motivo para preocupação!" e a dela também, pensei eu.
De esferográfica em punho, desatou a escrever tudo aquilo que eu tinha de começar a comer, assim como as devidas proporções:
"6 colheres de arroz, 3 de feijão bem cheias, 2 bifes de soja ou de seitan, molho de iogurte com fartura, 2 taças de cereais..."
Em completo estado de choque, e em nada convencida com a análise feita pela criatura, comecei a deambular o olhar pelo consultório, até que os meus olhos dão de caras com uma foto emoldurada, onde estava a doutora de chapéu e óculos de sol, algures numa praia rochosa, junto das amigas, todas elas anafadas, todas elas bem nutridas.
Era óbvio, tanto a doutora como as roliças precisavam de uma dieta asap.
Sem conseguir desviar o olhar da foto, era-me impossível dissociar as fortes semelhanças entre aquela foto, e as cenas habitualmente vistas no National Geographic, passadas no Árctico, das colónias de focas empoleirados em rochedos, alinhadas lado a lado, grandes e gordas, em amena cavaqueira.

A partir dali não havia nada a fazer, a pouca credibilidade que lhe ainda restava, foi cilindrada pós-foto. Nada nem ninguém me convenciam que era bom seguir o plano prescrito pela dita senhora. É que nem morta ia seguir-lhe os conselhos, mais depressa passava-lhe eu uma dieta, daquelas pouco calórica e que envolvem bastante actividade física, a aceitar fazer o que quer que fosse aos meus hábitos alimentares.
A experiência com a nutricionista revelou-se pouco eficaz, e a questão do vegetarianismo só se resolveu por altura dos Santos populares, quando no meio da confusão fui seduzida pelo peixe mais ordinário da praça, a sardinha.
Completamente hipnotizada pelo cheiro, comecei a salivar como nunca, e sem olhar para trás pedi-a no pão, a pingar, como se gosta.
Depois daquele flirt poderoso, era complicado resistir-lhe, as minhas papilas gustativas saltitavam de alegria, era o reencontro saboroso, perfeito, pelo qual sempre esperaram.
Depois da primeira trinca quebrei a barreira vega que então dominava a minha vida há meses, e daí em diante nunca mais fui a mesma ;)

Um comentário:

zephirus disse...

Então e bolo para celebrar essa passagem? Não houve?!?!? Caneco!