terça-feira, maio 25, 2010

O Luke Perry Luso

Quando era miúda, tive um crush por um amigo do meu irmão.
Ele era mais velho, era lindo de morrer, tinha toneladas de pinta, e destilava bom aspecto por onde quer que passasse.
Havia quem dissesse que parecia o Luke Perry, efeitos do então famoso 90210.

De feições esculpidas, olhos profundos, grandes e castanhos, tinha a capacidade de hipnotizar qualquer miúda com menos de 12 anos.
Apaixonada irremediavelmente por ele, tinha tendência a fazer perguntas sobre o rapaz, como quem não quer a coisa, mas ao mesmo tempo está morta por saber.
Depressa o meu irmão descobriu o meu calcanhar de Aquiles, e a partir desse dia, digamos que lhe bastava esmiuçar qualquer assunto sobre o amigo, e tinha a minha atenção, assim como uma ajuda garantida nos afazeres domésticos.


Basicamente o meu irmão deixou de mexer uma palha, porque na realidade não precisava, eu fazia-lhe a cama, punha-lhe a mesa, levava-lhe o lixo à rua, cedia-lhe os meus donuts, tudo à pala da minha paixão platónica, e da nesga de esperança resistente.
Durante os largos meses de verão suspirei como ninguém, porque não haviam palavras para descrever aquele êxtase arrebatador, provocado pelo rapaz perfeito, do sorriso fantástico, e porte atlético invejável, digno de um qualquer Deus grego.
Namoradas não lhe faltavam, todas giras, todas raparigas mais velhas que eu, uma fila considerável de pretendentes, capaz de irritar o mais comum dos mortais, com menos sorte ao amor.
Na altura tinha uma paixão assolapada por ele, mas era uma espécie de amor impossível, ele era mais velho, e eu uma rapariga sem mamas.
Cada vez que chegava ao pé de mim, tenho ideia de que o tempo parava, o meu coração disparava a mil à hora, e a respiração acelerava sem que tivesse qualquer tipo de controlo sobre ela.
Na maioria das vezes não conseguia sequer dizer uma frase que fizesse o mínimo de sentido.
À pergunta habitual,
"O teu irmão está por aí?"
anuía-lhe em jeito, e fazia o sorriso do mais tolo que pode haver, isto quando não conseguia grunhir sequer um monossílabo audível, pois a voz teimava em sumir sempre que ele aparecia, outro poder extraordinário que o rapaz tinha, aparentemente inexplicável, e que tinha a haver com um efeito castrador da acústica presente.
Lembro-me que lhe achava muita piada quando perguntava,
"Então canochas, tudo bem?!"
Pois eu sei, canochas não era propriamente a alcunha mais afectuosa do mundo, mas só o facto de ele me dirigir a palavra, já fazia de mim a miúda mais feliz da rua.

Com uma simples abordagem, fazia-me sonhar com tudo aquilo que poderíamos vir a ser, e como qualquer pré-adolescente, à posteriori analisava vezes sem conta o que é ele tinha dito, a entoação que tinha dado, as palavras que tinha utilizado, a figura de parva que tinha feito, enfim uma panóplia de algoritmos, numa espécie de missão impossível para descodificar o que poderia ser ou não, um sinal de reciprocidade amorosa.
Tadita...
No outro dia encontrei o "Luke Perry" luso da minha vida, e o Luke está velho, barrigudo, e enrugado.
Da conversa que tive com ele, percebi que o coitado não é afinal tudo aquilo que via nele.
O corpo já era, o sorriso amarelou, e pior de tudo, tem dificuldades em conjugar os verbos.

Hoje custa-me a perceber o porquê daqueles ataques aflitivos de pânico, dos arranjos trapalhões das palavras que saiam sob pressão, e dos desatinos mentais, que mais tarde só serviam para me chicotear, por não terem sido o suficientemente brilhantes, de modo a impressionar a dita criatura.
O Luke luso diz "prontos", "estivestes", e outras pérolas do género...
O brilho de outrora foi-se de vez, ficou a experiência de eu ter sido pateta, como toda e qualquer rapariga tem de ser, pelo menos uma vez na vida, está escrito, faz parte, é da praxe.

3 comentários:

Carla Santos Alves disse...

ahahah

Pois que a forma de falar nos faz confusão nao é?

Eles mudam e nós ficamos mais exigentes....
Amor e uma cabana já era...

Bjs

MAG disse...

LOL safaste-te de boa! Já me aconteceu o mesmo com um ex. Gordo, desleixado e barbudo. Hihihi. Bjs

O poeta e o Guerreiro disse...

Que saudades desses tempos. Em que uma apaixoneta fazia mover o nosso mundo... (suspiro)
O estomago enrolado, o secão na boca, as tonturas com o perfume da outra pessoa...
Alguém sabe onde se apanha o comboio de volta para a infância? lol :D